“Imagine acordar e perceber que você está trancado dentro de uma caixa”. “É uma caixa que envolve você com tanta perfeição e é tão bem ajustada a seu corpo que ela prende seus lábios, lhe impedindo de falar, mesmo que possa perceber o que acontece ao seu redor.”

 

O estado vegetativo é a mais frustrante das condições humanas. A pessoa está viva, abre os olhos, dorme, acorda, executa as funções fisiológicas, mas durante meses, anos, permanece alheia, incapaz de esboçar a menor reação.

Nessa situação, os familiares costumam perguntar: “Ela entende o que nós falamos? ”, “Percebe que estamos do lado dela? ”.

Para a medicina, estado vegetativo é uma condição na qual pacientes que emergem do coma parecem ter acordado, mas não dão qualquer sinal de haver recuperado a consciência. Para que o diagnóstico seja feito, não pode existir a menor evidência de algum comportamento intencional em resposta a estímulos externos.

A impossibilidade de documentar sequer resquícios de atividade mental através de testes comportamentais e dos exames neurológicos clássicos criou para os que se encontram nessa condição a imagem de mortos-vivos.

Nos últimos vinte anos, entretanto, o advento de novos métodos de avaliação das funções mentais permitiu identificar ilhas de atividade cognitiva preservada, em pequena porcentagem de casos classificados como tipicamente vegetativos.

Nessa linha, pesquisadores de Cambridge, na Inglaterra, acabam de publicar uma observação que despertou interesse imediato nos meios científicos. Através da ressonância magnética funcional, exame radiológico que permite obter imagens muito nítidas do sistema nervoso central e indicar os centros cerebrais que entram em atividade ao executarmos determinada tarefa, os autores estudaram uma moça de 23 anos que sofreu traumatismo craniano num acidente automobilístico ocorrido em julho de 2005. Cinco meses mais tarde a paciente permanecia em estado vegetativo: incapaz de responder aos estímulos, embora mantivesse os ciclos alternados de sono e vigília.

Numa primeira experiência, os neurologistas submeteram-na à ressonância magnética para avaliar se as áreas cerebrais responsáveis pela coordenação da linguagem entravam em atividade quando ela ouvia frases como: “Tem leite e açúcar no seu café”. Os resultados foram comparados com os obtidos quando o estímulo era provocado por ruídos desconexos e com aqueles realizados em voluntários (grupo-controle).

Ao ouvir as palavras, a ressonância detectou no lobo temporal da paciente atividade cerebral idêntica à do grupo-controle, e distinta da que foi detectada diante de ruídos aleatórios. E, mais, frases que continham palavras com sons ambíguos produziam atividade adicional nos centros que operam processos semânticos fundamentais para a compreensão da palavra falada (região frontal inferior esquerda).

Num segundo experimento, os médicos propuseram à doente e aos voluntários que imaginassem visitar todos os quartos de casa, partindo da porta de entrada ou que imaginassem estar jogando tênis. Foi detectada atividade cerebral intensa nos centros que coordenam orientação espacial e nas áreas do controle motor. Novamente, os mapas da atividade mental foram indistinguíveis daqueles encontrados no grupo-controle.

Apesar de preencher totalmente os critérios clínicos para sua condição ser classificada como vegetativa, a paciente mantinha habilidade de entender a linguagem falada e de responder por meio de atividade cerebral condizente com um ato claro de intenção.

É evidente que não podemos generalizar os resultados obtidos com essa jovem de 23 anos, portadora de poucas lesões cerebrais, mas a presença de respostas tão elaboradas a comandos de voz sugere que a ressonância funcional pode ser útil na avaliação do estado de consciência de pacientes não comunicativos.

Quando for possível documentar a existência de focos residuais de atividade cognitiva, poderão ser desenvolvidas estratégias para modulá-los com a finalidade de tentar estabelecer algum tipo de comunicação interpessoal.